O avanço tecnológico culminou em uma mudança importante na transformação digital no mundo dos negócios. Novas empresas aparecem diariamente, desafiando os modelos e provando que é possível fazer mais e melhor. Cabe às organizações mais tradicionais preverem e implantarem mudanças, buscando continuidade e sucesso no atual processo de evolução. Nesse contexto, quando o assunto é o impacto da tecnologia nos negócios, vale ressaltar que não basta que a empresa tenha o melhor departamento de tecnologia da informação ou o acesso aos dispositivos e soluções mais sofisticados. É preciso pensar em mudanças em um conceito mais amplo, para se efetivar uma transformação cultural na empresa, que considere lifelong learning, mindset digital, abertura para a inovação, diversidade, dentre outros tópicos.

Vale ressaltar que essa realidade não afeta apenas as áreas de negócios ou os front offices. Cada vez mais as áreas de Tax são exigidas para acompanhar essas mudanças. Na área tributária, chamamos isso de Tax Transformation, e é uma excelente oportunidade para os profissionais tributários revisitarem objetivos, estratégias e estruturas implantadas. Na verdade, o que se espera atualmente da área de tributos é diferente do que era esperado no passado. O mesmo se aplica para o profissional em si.

Sabemos que o fisco brasileiro é um dos mais avançados em transformação digital tributária no mundo. As declarações, reportes, autuações, dentre outras ações, já seguem um padrão eletrônico há muitos anos. No âmbito estadual, as notas fiscais eletrônicas e outras obrigações acessórias estão quase completamente acessíveis no formato digital. As autoridades fiscais utilizam tecnologia para processamento e análise de um grande volume de dados (big data) e geram automaticamente suas análises e questionamentos.

Por outro lado, os contribuintes buscam cumprir a legislação relativa ao recolhimento dos impostos e ter sistemas que permitam que tudo seja pago dentro da conformidade. Sabemos que isso representa um grande desafio para as empresas e, portanto, o momento é ideal para que os gestores das áreas de tributos revejam a forma como agregam valor às empresas e ousem implementar mudanças que levem suas áreas para essa nova realidade. 

Cada empresa tem seus desafios próprios na área de Tax. Na jornada Tax Transformation, é imprescindível conhecê-los e classificá-los por ordem de prioridade, mapeando o cenário atual.

Depois, ainda que não haja um orçamento para iniciar uma ampla transformação, pode-se optar por priorizar áreas que geram economia para financiar o projeto. É comum que ele comece com a automação de processos, projetos para a redução de multas ou soluções que possibilitem a avaliação de créditos tributários. Essa pode ser uma boa estratégia, desde que a empresa não perca de vista os objetivos que espera alcançar. Nesse sentido, é mais do que necessário ter um roteiro de toda a jornada de Tax Transformation para evitar o desperdício de esforços e garantir o progresso mesmo que lentamente.

Um bom ponto de partida é construir uma estratégia para o armazenamento de dados, já que, muitas vezes, os documentos fiscais não são armazenados de forma organizada e de fácil acesso. É fundamental ter uma estratégia de dados digitais. As empresas gastam muito dinheiro com a estrutura necessária para apresentar às autoridades informações e relatórios, mas têm dificuldade de usar os dados digitais produzidos para gerar informações estratégicas (data analytics), entender e corrigir o passado e fazer análise preditiva para planejar o futuro da área de tributos da empresa.

Muito se fala sobre aprendizado de máquina (machine learning) e inteligência artificial e há, de fato, muito espaço para melhorias e inovação na área tributária por meio do uso dessas tecnologias. No entanto, em uma realidade que ainda envolve muitas atividades manuais, documentos físicos relativos ao passado e falta de atenção com o uso de dados já gerados, é preciso avançar nesse sentido.  A jornada de transformação digital em Tax deve ter uma estratégia definida para o uso de dados, com a criação de um projeto de armazenamento dessas informações baseado em uma arquitetura eficiente e com segurança de dados.  

A partir desse ponto, muito pode ser feito em termos de soluções existentes no mercado. Pode valer a pena deixar o modelo tradicional com soluções antigas e embarcar em uma jornada para conhecer o ecossistema de inovação e até mesmo abrir novas possibilidades e insights. As soluções tecnológicas desejadas nem sempre estão prontas no mercado, e ser líder na área pode exigir o investimento na criação de uma solução de Tax personalizada.  

Outro tema crucial que deve ser discutido diz respeito à cultura da empresa, à área tributária e ao perfil dos profissionais de Tax responsáveis pela execução desse processo.

A resistência natural a essas mudanças pode surgir e deve ser um ponto de atenção. Muitas vezes ela é causada pela falta de conhecimento, de mindset digital, e de habilidades necessárias, além de inseguranças e incertezas sobre o futuro. Muitos profissionais tributários acreditam que, ao ajudar a empresa na transformação digital, existe a possibilidade de a mão de obra ser substituída por um robô.  É importante, portanto, que o processo seja conduzido com transparência e comunicação clara, sem haver espaço para especulações. Em vez disso, devem ser dadas condições aos profissionais para se atualizar e assumir novas demandas. Oficinas, aulas e treinamentos são partes inseparáveis do processo de transformação digital.

O fator humano também é cada vez mais valorizado em ambientes inovadores. A máquina ainda não é capaz de substituir o ser humano em toda a complexidade do processo de Tax. Equilíbrio, empatia, relacionamentos, colaboração, energia, persuasão e motivação ainda são habilidades humanas importantes em qualquer ambiente de trabalho e negócios da área de tributos e devem, mais do que nunca, ser valorizados na transformação digital.

Sócia-líder de Tax Transformation
KPMG no Brasil