A inteligência artificial (IA) está deixando de ser uma promessa futurista para se tornar uma realidade concreta no setor financeiro. De acordo com o estudo “KPMG Global AI in Finance Report”, 71% das empresas ao redor do mundo já utilizam IA em suas operações financeiras, com 41% aplicando-a de forma moderada ou intensa. Os dados apontam um movimento claro: a tecnologia está remodelando os processos financeiros, agregando agilidade, inteligência e precisão às tomadas de decisão.
A pesquisa, que ouviu executivos de 2.900 empresas em 23 países e territórios, destaca que a adoção da IA está se expandindo para diversas áreas, tais como contabilidade, gestão de tesouraria, gerenciamento de riscos e operações fiscais. Essa diversificação de aplicações demonstra a versatilidade e o potencial da IA em otimizar processos complexos.
No Brasil, embora o uso da IA esteja em fase de consolidação, os sinais de avanço são expressivos. O recorte local do estudo, realizado com 100 diferentes empresas, mostra que 58% dos entrevistados estão na fase de implementação da tecnologia e 15% já atingiram o estágio de maturidade. Setores como seguros, bens de consumo embalados e energia puxam essa evolução, em um cenário no qual 63% dos respondentes ocupam cargos de diretoria ou vice-presidência — o que reforça o protagonismo estratégico do tema.
As aplicações da IA e da Gen AI nas finanças brasileiras já são diversas. Entre elas, destacam-se a automação de tarefas repetitivas, como relatórios e cálculos fiscais; o uso preditivo para apoio à decisão; e a gestão proativa de riscos e fraudes. Embora a aplicação da IA em gestão tributária ainda seja incipiente no contexto global, 60% dos participantes brasileiros já consideram utilizá-la nessa área.
O investimento também vem crescendo: 42% das empresas destinam atualmente entre 5% e 10% do orçamento de TI para IA. Contudo, o retorno sobre investimento (ROI) ainda não está plenamente consolidado: apenas 26% afirmam ter superado as expectativas em ROI; entre as líderes em maturidade, esse índice sobe para 67%. Ou seja, há um diferencial competitivo claro entre quem apenas adota a tecnologia e quem a integra de forma estratégica, com visão de longo prazo.
Desafios à vista: da segurança de dados à mudança cultural
As barreiras, por sua vez, não são desprezíveis. Preocupações com segurança e privacidade de dados (63%), falta de competências técnicas (55%), custos de implementação (39%) e resistência cultural (24%) se impõem como desafios reais. Superá-los requer não apenas tecnologia, mas governança, capacitação e uma mudança de cultura organizacional — do topo à base.
A adoção de frameworks de governança, por exemplo, ainda está em estágio inicial no País: 34% das empresas já os implementaram e 26% buscaram validações externas para controle de qualidade. A maturidade digital, nesse contexto, não se resume à presença de ferramentas: envolve responsabilidade, transparência e sustentabilidade no uso da IA.
O estudo termina com recomendações que devem orientar os próximos passos das empresas: priorizar o uso estratégico da IA, planejar com cautela a adoção da Gen AI, expandir o papel das lideranças financeiras, investir em capacitação e trabalhar com auditorias externas para validar práticas e controles.
A conclusão é inequívoca: a IA nas finanças já não é mais uma questão de se, mas de como. O Brasil tem avançado e o potencial de aceleração é evidente.
Mas, para transformar oportunidade em vantagem competitiva, é preciso mais do que entusiasmo tecnológico: é essencial ter uma estratégia clara, alinhamento entre finanças e tecnologia e, acima de tudo, coragem para liderar. O Brasil tem talento, recursos e urgência. A pergunta que fica é: estamos prontos para deixar de seguir tendências e começar a ditá-las?
Por Frank Meylan, sócio-líder de Tecnologia, Transformação Digital e Inovação da KPMG no Brasil e na América do Sul, e Ricardo Santana, sócio-líder de Data & Analytics, Automação e Inteligência Artificial da KPMG no Brasil