Em setembro de 2024, foi aprovado o Projeto de Lei 528/20, que determina programas de incentivo ao diesel verde, ao biometano e ao combustível sustentável para aviação. Conhecido como PL dos “combustíveis do futuro”, o Projeto – que aguarda sanção presidencial – busca, entre outros objetivos, posicionar o Brasil no mercado de combustíveis renováveis.

No intuito de esclarecer os principais aspectos que compreendem a proposta, o entrevistado da edição de setembro da newsletter KPMG ESG Insights é Ricardo Roa, sócio-líder do setor Automotivo da KPMG no Brasil. O executivo também detalha as diretrizes centrais do PL e explica de que modo ele contribui para a construção de uma matriz energética mais sustentável. 

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KPMG ESG Insights

Quais são as principais diretrizes definidas pelo Projeto de Lei 528/20?

Ricardo Roa

Após longos debates, em setembro de 2024, a Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei 528/2020, conhecido como PL dos “combustíveis do futuro”. O PL, que aguarda a sanção presidencial, estabelece como principais diretrizes:

  • Promoção da mobilidade sustentável de baixo carbono.
  • Instituição de programas para biocombustíveis, como ProBioQAV e PNDV.
  • Alteração com possível aumento gradual das misturas de etanol e biodiesel.
  • Criação de um sistema de rastreamento dos combustíveis.
  • Regulação e fiscalização da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) sobre combustíveis sintéticos e captura de CO2.
  • Definição de metas de descarbonização e incentivo à pesquisa e produção de biometano.
  • Integração com políticas existentes de controle de emissões de GEEs, tais como a Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio), do Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover) e do Programa Brasileiro de Etiquetagem Veicular (PBEV).

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De que maneira o projeto contribui para a construção de uma matriz energética mais sustentável?

Ricardo Roa

Excelente pergunta! A meu ver, o PL promove a transição para uma matriz energética mais sustentável ao incentivar o uso de biocombustíveis e tecnologias limpas, reduzindo a dependência de combustíveis fósseis e estabelecendo metas claras para a redução de emissões. 

KPMG ESG Insights

Explique, por favor, a conexão do PL com o Programa Mover.

Ricardo Roa

O Programa Mover está conectado ao PL, mas voltado especificamente aos transportes, sejam urbanos, rodoviários, leves ou pesados, incluindo agrícolas, pois as empresas participantes do Mover também deverão atender a requisitos de medições de emissões de GEEs, bem como apresentar um inventário de pegada de carbono de suas plantas.

O Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) definirá metas para o Mover em relação: ao consumo energético (energia gerada por cada tipo de combustível para rodar um quilômetro); e em relação às emissões (gramas de gás carbônico equivalente por quilômetro) de cada tipo de veículo.

A partir dos parâmetros definidos pelo Mover, será possível projetar o quanto cada tipo de combustível gera de gás de efeito estufa para gerar uma unidade de energia. Isso chama-se Intensidade de Carbono da Fonte de Energia (ICE). Os valores serão fixados pelo Conselho Nacional de Politica Energética (CNPE) para cada participante do Programa. 

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De que modo o Agronegócio, incluindo o pequeno e o grande produtor, será impactado e qual a relevância para o setor?

Ricardo Roa

O Agronegócio será impactado positivamente pela demanda por biocombustíveis, oferecendo oportunidades para pequenos e grandes produtores na produção de biometano e biodiesel. Isso pode gerar novas fontes de receita e promover práticas agrícolas sustentáveis. Isso tem que ser feito protegendo os ecossistemas, que são necessários para estabilizar o clima. Mas é claramente uma excelente oportunidade, especialmente considerando as áreas degradadas.

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E o setor de Aviação?

Ricardo Roa

Segundo o PL, a partir de 2027, os operadores aéreos terão de reduzir as emissões de gases de efeito estufa nos voos domésticos por meio do uso de combustível sustentável de aviação (SAF). As reduções começam com 1% e crescem gradativamente até atingir 10% em 2037.

Mas vale salientar que o uso do diesel ainda é amplamente necessário como combustão, principalmente por conta da potência do avião. Mas certamente as companhias aéreas já estão avaliando uma alternativa mais sustentável, por exemplo, o biodiesel. 

KPMG ESG Insights

Qual o papel das tecnologias e parcerias para o sucesso do PL?

Ricardo Roa

Um aspecto relevante a ser destacado é a importância da parceria entre os setores públicos e privados na implementação das diretrizes do PL. A participação ativa da indústria, da sociedade civil e dos agricultores será essencial para o sucesso das metas de descarbonização. O desenvolvimento de tecnologias inovadoras e a capacitação técnica para a produção e o uso de biocombustíveis e biometano poderão gerar empregos e impulsionar a economia verde no Brasil. A integração de políticas públicas com incentivos fiscais e subsídios pode acelerar a transição energética e garantir que o País se torne um líder na luta contra as mudanças climáticas no campo da logística, contribuindo para um futuro mais sustentável e tornando nossas empresas exportadoras mais competitivas.

Mas ainda veremos debates no mercado, tanto pela ansiedade das muitas regulações que estão por vir, como pelos pleitos a serem considerados. Um bom exemplo é o fato de o PL não abordar questões que envolvem a combinação de diferentes matrizes energéticas, como a propulsão elétrica aliada ao etanol, e a exploração de combustíveis emergentes (hidrogênio), que podem ser estimulados por novas tecnologias de propulsão, especialmente híbridas. Essas inovações potencializam a descarbonização, promovendo uma matriz energética diversificada e sustentável, alinhada às metas de redução de emissões.

Sobre o Programa Mover

O Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover), de modo geral, beneficia as empresas do setor Automotivo, liberando crédito para Pesquisa & Desenvolvimento (P&D) de estratégias de produção tecnológica sustentável. O governo destinará R$ 19,3 bi em incentivos até janeiro de 2029, estimulando investimentos em modernização, sobretudo em tecnologias de novas propulsões, além de projetos destinados à descarbonização. 


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