Em dezembro de 2024, foi sancionada a Lei 15.042, que regulamenta o mercado de emissões de gases de efeito estufa, bem como cria o Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). Os objetivos do novo marco regulatório são especialmente mitigar os impactos das mudanças climáticas e reduzir as emissões de gases poluentes.
Para esclarecer as dúvidas que pairam sobre o assunto, o entrevistado da primeira KPMG ESG Insights de 2025 é Felipe Salgado, sócio-diretor líder de Descarbonização da KPMG no Brasil. O executivo detalha os próximos passos que as empresas precisam estar atentas, tais como o inventário de GEE, e explica um pouco mais sobre as definições da Lei.
Acompanhe!
KPMG ESG Insights
Apesar de ser uma decisão importante do Congresso, quanto tempo será necessário para que as regras do mercado regulado de carbono estejam bem estabelecidas?
Felipe Salgado
A aprovação da Lei 15.042 é um passo importante para a agenda climática do nosso País, que avançou rumo a um mercado regulado de emissões de gases de efeito estuda. Contudo, de acordo com o Roteiro de Implementação do SBCE, para a implementação plena do sistema, ainda serão necessárias mais quatro fases, cuja previsão de duração é entre quatro e seis anos.
Tais etapas envolvem: definição dos arranjos de governança do sistema; desenvolvimento do regulamento específico de MRV (monitoramento, relato e verificação) das emissões de GEEs; credenciamento de verificadores de relato; elaboração do primeiro Plano Nacional de Alocação, o qual definirá a trajetória dos limites de emissões do sistema durante o primeiro período de conformidade e sua duração; e determinação de regras para a alocação gratuita de Cotas Brasileiras de Emissões (CBE).
KPMG ESG Insights
Quais setores serão mais impactados?
Felipe Salgado
De acordo com o definido em Lei, a regulamentação aplica-se a todas as atividades, fontes e instalações nacionais que emitam (ou possam emitir) gases de efeito estufa, com exceção da produção primária agropecuária e das emissões indiretas da produção de insumos ou matérias-primas agropecuárias. Entretanto, em uma primeira análise, as exigências definidas na regulamentação afetarão principalmente setores com altas emissões de GEEs, tais como energia (especialmente usinas movidas a combustíveis fósseis), manufatura pesada, siderurgia, cimenteiras, petroquímicas, aviação e transporte. Essa análise ainda não pode ser mais precisa, pois depende de critérios que apenas serão definidos no processo de operacionalização.
KPMG ESG Insights
Qual o papel de vendedores e compradores de crédito de carbono?
Felipe Salgado
O artigo 30 da Lei menciona que todas as instalações que emitam acima de 10.000 toneladas de CO2 por ano deverão elaborar o inventário de GEE e submeter um plano de monitoramento ao órgão gestor do SBCE. As instalações com emissões acima de 25.000 toneladas de CO2 ao ano deverão fazer os relatos de conciliações, ou seja, terão de apresentar um balanço das emissões anuais e, para aquele volume que ficar acima do limite (CAP) estabelecido (que ainda será definido para cada setor), será necessário comprar as CBE ou o Certificado de Redução ou Remoção Verificada de Emissões (CRVE).
De modo geral, as CBE são emitidas por empresas com emissões anuais que ficam abaixo do CAP setorial e serão negociadas com as empresas que ficarem com emissões acima do CAP. Outra possibilidade para as empresas emissoras, além do CAP, é comprar CRVE, que são créditos de carbono reconhecidos e inscritos no Registro Central do SBCE. Vale destacar que, mesmo a Lei prevendo a utilização de créditos de carbono do mercado voluntário no formato de CRVE, ainda não há a definição de quais tipos (e metodologias) poderão ser utilizados.
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Como as empresas devem preparar-se para as mudanças?
Felipe Salgado
O primeiro passo é fazer o inventário de GEE para entender o volume de emissões que são geradas em suas dependências. Com base nisso, as empresas podem identificar áreas as quais as reduções podem ser feitas de forma eficaz e econômica. Investir em tecnologias limpas e eficiência energética pode reduzir a necessidade de compra de cotas de emissões ou créditos de carbono. Além disso, desenvolver ou investir em projetos que gerem créditos de carbono pode ser uma estratégia para criar um fluxo de receita adicional e, ao mesmo tempo, contribuir com o meio ambiente. Por fim, manter-se a par sobre a operacionalização da legislação e as tendências do mercado de carbono é vital para decisões mais estratégicas.
KPMG ESG Insights
Há algo que queira acrescentar?
Felipe Salgado
O modelo de regulamentação de mercado escolhido pelo Brasil (Cap-and-Trade) é o mesmo utilizado pela União Europeia, onde houve a comprovação de eficiência em relação ao incentivo para a implementação de soluções de descarbonização. O modelo prevê que o limite de emissões setoriais vá decrescendo com o passar do tempo, fazendo com que a quantidade de cota de emissões reduza no mercado, gerando um aumento no preço dessas autorizações – o que favorece a implementação de tecnologias menos carbono intensivas.