A infraestrutura de blockchain e sua adoção no mercado financeiro abrem diversas oportunidades devido ao potencial de simplificar o processo de aquisição e registro de ativos financeiros
Muito se discute sobre o processo de transformação de ativos do mundo real em ativos digitais por meio do processo de tokenização, inclusive considerando diretrizes regulatórias da Lei n° 13.709/2018, ou Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e da Resolução CMN 4893/2021 de Segurança da Informação, Payment Card Industry (PCI) e Payments Services Directive (PSD2), que estabelecem orientações relacionadas aos temas de Privacidade, Segurança de Informação e do segmento de cartões como meios de pagamento e serviços relacionados a pagamentos.
Além disso, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) regulamentou, em 2021, por meio da Resolução 29, a criação do Sandbox Regulatório, um ambiente experimental em que as pessoas jurídicas participantes podem receber autorizações temporárias para testar modelos de negócio inovadores e ofertá-los no mercado de valores mobiliários sob supervisão da CVM.
A infraestrutura de blockchain e sua adoção no mercado financeiro abrem diversas oportunidades devido ao potencial de simplificar o processo de aquisição e registro de ativos financeiros, reduzindo o custo operacional em comparação com operações de investimentos tradicionais, além de aumentar a oferta de produtos financeiros alternativos e inovadores. Estima-se que a utilização de blockchain pode reduzir o custo de infraestrutura bancária em até 30%, de acordo com o relatório Banking on Blockchain: A Value Analysis for Investment Banks, da McLagan.
O crescimento da tecnologia de blockchain tem sido alavancado pelo aumento da complexidade dos processos de privacidade de dados e segurança de informação, sendo uma solução que não requer a ampliação de funcionalidades de uma instituição e não demanda a contratação de terceiros para suportar as operações de sustentação.
Os principais pontos a serem endereçados para que o blockchain se torne uma tecnologia de uso massivo são: velocidade de desempenho; interoperabilidade; custos; definição de regulamentações a fim de estabelecer diretrizes claras; e colaboração. Além disso, exige alinhamento com os reguladores acerca da dinâmica dos contratos inteligentes e de transações internacionais, que abrem oportunidades para investimentos e identificação de casos de uso.
Os benefícios, para o ecossistema financeiro, da integração tecnológica no contexto de blockchain por meio da tokenização extrapola para novos modelos de negócio, estimulando o desenvolvimento de projetos que envolvem tokenização de valores mobiliários e instrumentos financeiros, provocando também uma mudança no perfil de profissional apto a atuar nesse cenário, com competências que envolvem desde análise de dados (a fim de agregar valor ao cliente por meio da personalização das soluções ofertadas que atendam suas necessidades) até conhecimento sobre regulação e mercado financeiro.
De acordo com um estudo realizado pela Anbima em 2022, intitulado Tokenização de ativos: conceitos iniciais e experimentos em curso, a expectativa é que o avanço na tokenização de ativos financeiros e valores mobiliários leve os intermediários financeiros a demandarem um meio de pagamento digital que possibilite a liquidação dos ativos diretamente via blockchain. Nesse contexto, os projetos de emissão de moedas digitais emitidas pelos bancos centrais (CBDC - Central Bank Digital Currency), por meio de registro descentralizado, despontam como uma possibilidade de liquidar as transações por meio de blockchain, com a estabilidade e a segurança jurídica das moedas fiduciárias.
Além disso, a Federação Nacional de Associações dos Servidores do Banco Central (Fenasbac) mantém o programa NEXT, com o intuito de avaliar a viabilidade de modelo de negócios inovadores e escaláveis que se relacionem ou envolvam novas tecnologias, não apenas relativas a soluções de transformação digital, mas orientadas para o futuro da Internet e o empoderamento do usuário, baseadas em blockchain, tokenização, descentralização e identidades autossoberanas.
Há ainda os casos de uso no contexto de serviços financeiros, a exemplo do Payment versus Payment (PvP), em que o pagamento de uma moeda só é efetuado após a transferência de outra moeda, de modo a garantir ganhos em termos de liquidez por meio da compensação prévia à liquidação financeira – Delivery versus Payment (DvP), em que a liquidação do título ocorre apenas mediante seu pagamento. Nesse sentido, notamos que, além das diretrizes regulatórias que precisam ser observadas e outras que ainda estão em processo de definição, os players de mercado necessitam avaliar seus modelos operacionais, incluindo aspectos de Tecnologia e Segurança de Informação, de modo a realizar as adaptações necessárias e assim suportar o desenvolvimento de novos modelos de negócios, contemplando a oferta de produtos e serviços financeiros, bem como a forma de entrega aos seus clientes finais, com o objetivo de se posicionarem estrategicamente no ecossistema financeiro e aproveitarem os benefícios que essas transformações estão trazendo ao mercado.
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Thiago Rolli
Sócio de Consulting da KPMG no Brasil
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