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Contabilizando os custos de contratos de serviços de nuvem para fornecimento de software como serviço (SaaS) de acordo com as normas internacionais de contabilidade IFRS®.

Clientes que possuem contratos de software como serviço (SaaS) enfrentam complexidades ao determinar a contabilização apropriada de acordo com as normas IFRS® para honorários pagos a provedores de serviço de nuvem e custos de implementação relacionados. Uma recente decisão de agenda do IFRS Interpretations Committee (IFRIC) esclarece estes aspectos e confirma diferenças para a contabilização em US GAAP. Neste artigo, resumimos as considerações sobre relatórios financeiros e apresentamos uma estrutura de contabilização para os custos de implementação relacionados. 

O que é um contrato de software como serviço (SaaS)?

Similar aos contratos de plataforma como serviço e de infraestrutura como serviço, um contrato SaaS é um contrato de serviço de computação em nuvem, e também um tipo de contrato de hospedagem de software, onde o cliente obtém acesso ao software que é hospedado pelo fornecedor (ou por um terceiro em seu nome). Em certos contratos de hospedagem, o direito do cliente acessar o software hospedado pode dar origem a um ativo intangível (licença), enquanto que, em outros, nenhum ativo intangível é gerado. Tais contratos são comumente conhecidos como contratos SaaS.

Normas internacionais de contabilidade IFRS®

As atuais orientações das normas IFRS® não endereçam explicitamente a contabilização dos honorários pagos a fornecedores de SaaS ou dos custos de implementação incorridos em tais contratos na perspectiva do cliente. Entretanto, duas decisões de agenda do IFRIC fornecem uma estrutura para a sua contabilização:

  • Uma decisão de agenda em 2019 distingue os contratos de hospedagem que geram um ativo intangível para o cliente daqueles que não o geram e que, portanto, são contratos de serviço (contratos de SaaS)1.
  • Uma decisão de agenda de abril de 2021 incluiu orientações de contabilização dos custos de implementação incorridos em contratos SaaS na perspectiva do cliente.2

A estrutura de contabilização destacada neste artigo é consistente com essas decisões de agenda.

O contrato de hospedagem de software dá origem a um ativo de software?

Na data de início de um contrato de hospedagem, surge uma questão envolvendo a determinação sobre se a empresa recebe um ativo de software, seja no âmbito da IAS 383 (CPC 04) ou da IFRS 164(CPC 06 (R2)) (um arrendamento de software), ou se, ao invés disso, a entidade recebe apenas um SaaS.

Em nossa experiência, contratos de hospedagem de software geralmente não dão origem a um ativo de software, não atendem à definição de um arrendamento e frequentemente não dão origem a um ativo intangível de acordo com a IAS 38 (CPC 04).

O direito de acessar o software do fornecedor geralmente não dá origem a um ativo intangível pois tal direito por si só não concede ao cliente o controle sobre o software através do qual ele irá obter benefícios econômicos futuros e tampouco o direito de restringir o acesso de terceiros. Entretanto, em certas circunstâncias, uma empresa pode chegar a uma conclusão diferente. As seguintes características de um contrato de hospedagem poderiam indicar que a empresa obtém o controle de um ativo intangível de software:

  • Direito de obter posse de uma cópia do software e rodá-lo em uma infraestrutura computacional própria ou de terceiros; ou
  • Direito de uso exclusivo do software ou titularidade de propriedade intelectual de um software customizado, ou seja, o fornecedor não pode disponibilizar o software para outros clientes.

Se a empresa determinar que um contrato de hospedagem não dá origem a um ativo intangível de software, ela reconhece as despesas relacionadas à medida em que recebe o SaaS, ou seja, durante o período do contrato.

Se a empresa efetua o pagamento do SaaS de forma antecipada, ela reconhece um ativo de despesa antecipada. Por outro lado, se ela receber acesso ao software antes de ter realizado o pagamento, ela reconhece um passivo financeiro.

Custo de implementação: capitalizar ou reconhecer como despesa?

Em conexão com o contrato de hospedagem, a empresa pode incorrer com diversos custos iniciais de implementação, como por exemplo, custos com testes, conversão e migração de dados, interface, configuração e customização. A contabilização dos custos de implementação dependerá se a empresa determinar que está recebendo um ativo intangível de software de acordo com o IAS 38 (CPC 04).

Contratos que dão origem a um ativo intangível de software

Para os contratos de hospedagem de software que dão origem a um ativo intangível, os custos do ativo de software são determinados com base na orientação da IAS 38 (CPC 04). O custo do ativo inclui os custos diretamente atribuíveis para preparação do software para o seu uso pretendido. Consistente com a contabilização de uma licença de software, muitos custos de implementação são, portanto, capitalizados como parte do custo do ativo de software, tais como custos com folha de pagamento e benefícios de funcionários internos, honorários de serviços profissionais externos incorridos para instalação, configuração e teste do software.

Contratos que não dão origem a um ativo intangível de software

Em um contrato de SaaS, os custos iniciais de implementação geralmente precisam ser contabilizados como despesa durante a execução dos serviços de implementação. Isso ocorre pois o direito do cliente de acessar o software hospedado não gera um ativo intangível de software para o cliente, a menos que:

  • Os serviços de implementação não sejam distintos do SaaS; ou
  • O custo dá origem a um ativo tangível ou intangível separado. Por exemplo, a compra de equipamentos de TI ou o desenvolvimento de uma interface de software controlada pelo cliente.

Acreditamos que a seguinte estrutura deve ser aplicada para determinar a contabilização dos custos de implementação de contratos SaaS:

Os serviços de implementação são executados pelo provedor do SaaS?

Em alguns contratos SaaS, o provedor pode executar serviços de implementação além de fornecer o SaaS. Nesse caso, o cliente deveria avaliar os serviços de implementação e determinar se eles são distintos do SaaS. A orientação envolvendo obrigação de desempenho na IFRS 155 (CPC 47) fornece uma estrutura relevante para determinar se os serviços de implementação são distintos do SaaS.

Acreditamos que os serviços prestados pelo fornecedor de SaaS que poderiam ser executados internamente ou por terceiros que não o próprio fornecedor de SaaS são geralmente distintos do SaaS. Nesse caso, os serviços de implementação do provedor de SaaS não são essenciais para a capacidade do cliente em obter os benefícios derivados do SaaS porque serviços de implementação substancialmente semelhantes podem ser obtidos de outra forma. Restrições contratuais que exijam que o cliente obtenha os serviços do provedor de SaaS não alteram esta avaliação.

Em nossa experiência, muitos dos serviços de implementação como por exemplo, configuração, instalação e testes, podem geralmente ser executados por um terceiro que não o fornecedor de SaaS.

Se os serviços de implementação são distintos do SaaS, os custos relacionados devem ser contabilizados como despesas à medida em que os serviços são prestados, a menos que deem origem a um ativo intangível separado de acordo com a IAS 38 (CPC 04). Por outro lado, se o provedor de SaaS é a única empresa que pode fornecer um serviço de implementação específico e tal serviço é essencial para a capacidade do cliente de derivar o benefício pretendido do SaaS, isso indica que o serviço de implementação não é distinto. Nesse caso, os custos de implementação relacionados deveriam ser reconhecidos como despesa ao longo do período do SaaS, ou seja, como parte do custo daquele serviço. Se o cliente pagar pelos serviços de implementação antecipadamente (por exemplo, através de uma taxa inicial), ele deve reconhecer um ativo de despesa antecipada.

Os gastos com implementação dão origem a um ativo intangível separado?

Os custos de implementação relacionados a um contrato de SaaS costumam ser significativos. Entretanto, em nossa experiência, existem circunstâncias limitadas nas quais um ativo intangível separado pode ser reconhecido quando adquirido ou criado.

Os custos diretamente atribuíveis de preparação de software para o seu uso pretendido são capitalizados somente quando a empresa adquire um ativo intangível de software. Um contrato de SaaS não inclui, por si só, tal ativo. Portanto, os custos diretamente atribuíveis incorridos para preparar o SaaS para seu uso pretendido (como por exemplo, configuração e testes) não são capitalizados. Ao invés disso, tais custos são reconhecidos como despesas quando incorridos (ou seja, quando o serviço for recebido), a menos que, conforme descrito acima, o serviço de implementação não seja distinto do SaaS.

Os custos com conversão e migração de dados geralmente não criam um ativo intangível separado. Isso porque os dados de uma empresa (como por exemplo, transações históricas registradas em um sistema de software legado ou em banco de dados) não atendem aos critérios de reconhecimento do IAS 38 (CPC 04). Além disso, os gastos com atividades de treinamento são reconhecidos como despesas conforme incorridos de acordo com a IAS 38 (CPC 04).

Entretanto, acreditamos que gastos para criação de uma nova interface entre o software existente da empresa e o software hospedado pode resultar na criação de um ativo intangível separado de acordo com o IAS 38 (CPC 04), como por exemplo, criação de um novo código de software controlado pela empresa.

Comparação com o USGAAP

O FASB emitiu orientação explícita sobre a contabilização de contratos de computação em nuvem, incluindo contratos  SaaS. 6. De acordo com o US GAAP, as taxas de subscrição pagas ao provedor de SaaS são geralmente reconhecidas como despesas durante o período do contrato.

Entretanto, o US GAAP exige que os custos de implementação incorridos pelos clientes em contratos SaaS sejam capitalizados e reconhecidos ao longo do “prazo do contrato de hospedagem”, se tais custos fossem capitalizados pelo cliente em um acordo de licenciamento de software de acordo com a orientação de software de uso interno contida no ASC 350- 40. 7 Essa orientação se aplica aos custos de implementação, sejam eles fornecidos internamente, pelo provedor de SaaS ou por um terceiro.

Portanto, embora as empresas geralmente cheguem a respostas consistentes sobre se um contrato de hospedagem de software dá origem a um ativo intangível de software, existem diferenças com as normas IFRS® no que se refere ao tratamento dos custos de implementação em contratos SaaS. As empresas geralmente capitalizam menos custos de implementação de SaaS de acordo com a IFRS® quando comparado ao US GAAP.

Mensagem final

Em nossa experiência, a contabilização de contratos SaaS (e outros sistemas de computação em nuvem) é cada vez mais importante, pois seu uso hoje é uma prática comercial em crescimento. Alcançar conclusões adequadas sobre se um contrato de hospedagem de software dá origem a um ativo de software, se os serviços de implementação são distintos do SaaS e se um ativo intangível de acordo com a IAS 38 (CPC 04) é criado pelas atividades de implementação podem ter efeitos significativos nos relatórios financeiros. Clientes que entrem em contratos de hospedagem de software devem assegurar que possuem processos e controles adequados para realizar tais avaliações. Além disso, as empresas que reportam em IFRS e US GAAP devem permanecer alertas sobre diferenças significativas nas normas contábeis envolvendo este assunto.

Notas de rodapé

1.      Customer’s Right to Receive Access to the Supplier’s Software Hosted on the Cloud (IAS 38 Intangible Assets), March 2019

2.      Configuration or Customization Costs in a Cloud Computing Arrangement (IAS 38 Intangible Assets), April 2021

3.      IAS 38, Intangible Assets

4.      IFRS 16, Leases

5.      IFRS 15, Revenue from Contracts with Customers

6.      ASU 2018-15, Customer’s Accounting for Implementation Costs Incurred in a Cloud Computing Arrangement That Is a Service Contract

7.      ASC 350-40, Intangibles—Goodwill and Other—Internal-Use Software

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