Para muitas empresas europeias, integrar critérios ambientais, sociais e de governação ao longo da cadeia de valor deixou de ser opcional. Hoje, não é só uma obrigação legal, como deve ser uma aposta estratégica dos gestores, defendem os peritos.

A integração dos critérios ESG (ambientais, sociais e de governance) nas cadeias de valor das empresas já não é apenas uma tendência ou boa prática: é uma exigência regulatória com impacto direto no negócio. Diretivas europeias, como a CSDDD e a CSRD, obrigam as organizações a prestar contas sobre o impacto que os seus fornecedores e parceiros têm no ambiente e nos direitos humanos.

A necessidade de descarbonizar a produção está a pôr pressão sobre os fornecedores.

Pedro Q. Cruz, ESG Coordinator Partner da KPMG Portugal

1 - De que forma as empresas estão a integrar critérios ESG ao longo da sua cadeia de valor – e quais são os maiores desafios que enfrentam nesse processo?

Cada vez mais empresas estão a incorporar critérios ESG na seleção e gestão dos seus fornecedores, selecionando fornecedores com práticas ambientais responsáveis, respeito pelos direitos humanos e ética nos negócios. No setor automóvel, por exemplo, a crescente necessidade de descarbonizar a produção está a colocar uma grande pressão sobre os fornecedores de peças e matérias-primas. Por outro lado, no retalho, discute-se cada vez a rastreabilidade dos produtos e o combate a práticas laborais abusivas na cadeia de valor.

No entanto, as empresas continuam a enfrentar desafios significativos, como a visibilidade reduzida sobre fornecedores indiretos, a ausência de dados fiáveis na cadeia de valor e a dificuldade em alinhar fornecedores fora da União Europeia a padrões exigentes são obstáculos comuns.

2 - O que distingue as empresas que estão verdadeiramente a transformar as suas cadeias de valor, das que apenas cumprem o mínimo regulatório?

A diferença está no grau de ambição e integração com a estratégia de negócio. As empresas que não se limitam ao foco regulatório, integram fatores ESG nas suas decisões estratégicas, definem metas para os seus fornecedores, promovem relações de parceria e exigem compromissos e melhorias contínuas à sua cadeia de valor. Não se limitam a responder a obrigações formais, usam o ESG para criar valor e vantagem competitiva. As empresas que se preocupam apenas em cumprir os mínimos regulatórias, adotam uma postura reativa, sem impactos reais na forma de operar ou gerir os riscos dos seus negócios.

3 - Como está a regulação – europeia e internacional – a influenciar a forma como as empresas gerem os seus fornecedores e parceiros?

A nova geração de regulamentos europeus está a redefinir o que se espera das empresas. A Diretiva de Due Diligence (CSDDD) impõe obrigações concretas de identificação, prevenção e mitigação de impactos negativos nos direitos humanos e ambiente ao longo da cadeia de valor. A nova diretiva europeia CSRD (Corporate Sustainability Reporting Directive), que obriga milhares de empresas a reportarem informação de sustentabilidade, e as normas ESRS (European Sustainability Reporting Standards), que a operacionaliza e detalham os temas a reportar, incluindo impactos na cadeia de valor, estão a elevar significativamente a fasquia. Cumprir o mínimo já não é suficiente, é preciso transformar a forma como a empresa se relaciona com os seus fornecedores e parceiros.

4 - Que papel têm as novas tecnologias na construção de cadeias de valor mais sustentáveis e transparentes?

A tecnologia está a tornar possível o que antes era inviável. Há soluções que permitem rastrear a origem de matérias-primas de forma segura, plataformas de dados ESG e ferramentas de inteligência artificial que ajudam a prever riscos, a monitorizar o desempenho ambiental e a apoiar decisões estratégicas. Estas ferramentas estão a aumentar a transparência na avaliação da performance ambiental e social da cadeia de valor, mas só criam valor quando verdadeiramente integradas numa estratégia clara e com verdadeiro compromisso com a sustentabilidade.

 

Pedro Cruz para o Jornal de Negócios a 21 de maio de 2025