O panorama empresarial moderno está a sofrer uma transformação profunda, onde os fatores Ambientais, Sociais e de Governança (ESG) deixaram de ser considerações periféricas para se tornarem componentes centrais de uma estratégia empresarial bem-sucedida. A agenda ESG reflete um reconhecimento crescente de que as empresas devem operar de forma sustentável e ética, não apenas para cumprir regulamentações ou melhorar a imagem pública, mas como um aspeto central da sua identidade e operações.

Incorporar efetivamente os princípios ESG na estratégia da empresa permite que esta reduza a sua vulnerabilidade ao Greenwashing, uma palavra que tem ganho muita atenção nos últimos anos e que se refere à prática de as empresas divulgarem publicamente informação incorreta, ou desalinhada com a realidade, sobre os benefícios ambientais e sociais dos seus produtos e/ou serviços, bem como sobre as suas práticas de governação e a forma como conduzem o seu negócio. É cada vez mais comum depararmo-nos com produtos de diversas naturezas com etiquetas EcoGreen/VerdeSustentável e afins, mas se tentarmos contactar a marca e pedirmos informação detalhada sobre o produto, a fim de compreender a robustez das práticas que concorrem para aquela etiqueta, será que conseguimos obter informação concreta? E a preocupação estende-se além de etiquetas descaradas em produtos, por vezes o greenwashing pode estar num documento publicamente disponível no website de uma empresa que, quando questionada sobre a sua existência ou efetiva aplicação, apercebemo-nos que não passa de um wishful thinking. E é aqui que entra a necessidade premente de mudança e de garantir a integração efetiva do ESG na estratégia das empresas e nas várias práticas de relacionamento com o mercado. 

Mudança essa que é suportada por uma junção de fatores que tornam o Business Case para o ESG convincente e multifacetado. Se por um lado temos as alterações regulamentares, com a crescente exigência às empresas para reporte de informação relacionada com as várias dimensões da sustentabilidade, criando o efeito dominó de influência entre toda a cadeia de valor de uma empresa, por outro, temos a procura dos investidores ou as expetativas dos consumidores, e a necessidade urgente de enfrentar desafios globais como as alterações climáticas ou as desigualdades sociais.

As empresas já se aperceberam que os governos e órgãos reguladores estão a implementar regulamentações mais rigorosas relacionadas com ESG, desde emissões de carbono até às práticas laborais, como a Corporate Sustainability Reporting Directive (CSRD) ou a Corporate Sustainability Due Diligence Directive (CSDDD). E apesar de entrarem em vigor de forma faseada, vão abranger todas as empresas – das grandes, às mais pequenas – e mesmo as que não são abrangidas diretamente pelas novas diretivas, serão impactadas pelo tal efeito dominó. Quando uma empresa com a qual se relaciona começar a questionar ou exigir informação sobre práticas ambientais, sociais e de governança, seja enquadrado nos seus processos de identificação e gestão de riscos, seleção de fornecedores, ou outros, as empresas mais pequenas terão de se ajustar e garantir que conseguem fornecer a informação, sob pena de perderem alguns dos seus mais relevantes clientes/parceiros de negócios. E por isso, todas as alterações regulamentares devem ser analisadas e tidas em consideração por todas as empresas, com o olhar no futuro e nas implicações que poderão daí advir para os seus negócios.

Do ponto de vista financeiro, a integração de ESG na estratégia empresarial pode levar a uma melhor gestão de riscos e as empresas com práticas robustas de ESG estão frequentemente em melhor posição para antecipar e mitigar riscos relacionados com questões ambientais, penalizações regulamentares ou impactos de natureza social, através da redução da sua pegada de carbono, implementação de melhorias na gestão de resíduos ou investimentos em recursos de origem sustentável comprovada, permitindo evitar custos associados a futuras alterações regulamentares ou à remediação ambiental.

Por outro lado, do ponto de vista do investidor, há evidências crescentes de que o desempenho ESG está relacionado com os retornos financeiros e esta tendência leva a um aumento no número de investidores que consideram critérios ESG, além dos indicadores financeiros tradicionais, como parte crucial das suas decisões de investimento.

A verdade é que empresas com práticas ESG sólidas tipicamente apresentam menor probabilidade de desenvolverem fatores que as coloquem numa posição que possa levar a perdas financeiras significativas, como o incumprimento face a questões regulatórias ou situações que, de alguma forma, provoquem danos na sua reputação. E por isso, as empresas que negligenciam as considerações ESG podem encontrar-se em desvantagem na atração de investimentos, bem como no acesso a capital e custo associado.

comportamento dos consumidores, que estão cada vez mais informados e preocupados com as práticas éticas das empresas que apoiam, é mais um dos fatores em destaque. As marcas que demonstram um compromisso com os princípios ESG tendem a garantir uma maior lealdade dos clientes e a aumentar o seu valor de marca. Isto é particularmente evidente em indústrias como a moda, alimentação e tecnologia, onde os consumidores preferem cada vez mais produtos com origem ética comprovada, e ambiental e socialmente responsáveis.

Este movimento é fortemente impulsionado pelo acesso a canais digitais e de pesquisa rápida, onde a informação está acessível e é disseminada de forma avassaladora, permitindo ao consumidor a comparação em tempo real de marcas ou produtos específicos.

No setor da moda, por exemplo, as marcas que adotam práticas de produção sustentáveis, utilizam materiais reciclados ou orgânicos, e que garantem condições de trabalho justas para os seus trabalhadores, são frequentemente preferidas pelos consumidores, mesmo que isso implique a seleção por um produto mais caro.

O mesmo se verifica na indústria alimentar, a preferência por produtos orgânicos, de comércio justo e que se afastem de práticas de crueldade animal está em ascensão, com os consumidores cada vez mais atentos aos impactos ambientais da produção de alimentos e à ética no tratamento dos animais.

Por sua vez, no setor tecnológico, o ESG está também a ganhar destaque, com os consumidores de produtos eletrónicos interessados em perceber, por exemplo, a abordagem ao ciclo de vida dos produtos, nomeadamente no que diz respeito à reciclagem de componentes eletrónicos. 

É cada vez mais evidente que as práticas éticas e sustentáveis não são apenas uma tendência passageira, mas uma exigência crescente por parte dos consumidores, o futuro do consumo está intrinsecamente ligado à responsabilidade social e ambiental das empresas.

Um outro fator crítico e que suporta o Business Case para a integração de ESG está relacionado com a atração e retenção de talento. Os colaboradores, particularmente as gerações mais jovens como os millennials e a geração Z, estão cada vez mais à procura de empregadores cujos valores se alinhem com os seus. Temos observado no dia-a-dia a uma mudança de perguntas e manifestações de prioridades durante as entrevistas de emprego. Mais do que salário, que continua naturalmente a ser uma questão transversal a todos os candidatos, as perguntas têm-se centrado muito no equilíbrio entre vida profissional e pessoal. Especialmente nas camadas mais jovens, os candidatos estão cada vez mais interessados em entender como a nossa empresa apoia o bem-estar dos seus colaboradores, seja através da oferta de horários de trabalho flexíveis e políticas de trabalho remoto, como também através de programas de bem-estar e oportunidades de desenvolvimento pessoal.

Este foco no equilíbrio entre trabalho e vida pessoal é reflexo de uma mudança maior na perceção do que constitui uma carreira satisfatória e sustentável.

O ponto-chave da mudança é reconhecer o Business Case e compreender que integrar as dimensões ESG na estratégia empresarial é uma jornada e requer uma abordagem sistemática que alinhe os objetivos ESG com a missão e operações principais da empresa. E só é possível se for aliado a um forte compromisso da liderança, garantindo que as considerações ESG estão incorporadas no processo de tomada de decisões estratégicas. Se há uns anos a estratégia de sustentabilidade era definida paralelamente à estratégia da organização, com metas e ações próprias, hoje isso já não é possível e o sucesso da organização está intrinsecamente ligado ao cumprimento de objetivos conjuntos, que permitam a entrega do maior valor no mercado, alinhado com as expetativas dos diversos stakeholders, sejam eles internos ou externos. E para compreender que expetativas são essas, permitindo canalizar esforços e direcionar as ações, é fundamental que a empresa faça uma avaliação de materialidade, a fim de identificar as questões ESG mais relevantes quer do ponto de vista da empresa e da sua continuidade de negócio, numa perspetiva mais financeira, como do ponto de vista dos seus stakeholders, numa perspetiva do impacto que as operações diretas e relações ao longo da cadeia de valor têm, ou podem ter, na sociedade e no ambiente. E isto só é possível com o envolvimento dos vários grupos de stakeholders que interagem com a empresa, desde os investidores, aos colaboradores, clientes, fornecedores, e até as comunidades locais que são tantas vezes impactadas por decisões estratégicas de negócio e que podem ver os seus interesses desconsiderados.

Ao identificar estas questões relevantes, a que chamamos materiais, as empresas podem então refletir, definir modelos de atuação, definir metas ambiciosas ou alinhadas com standards internacionais e trabalhar com um objetivo concreto – tornar as suas operações e cadeia de valor mais sustentáveis. De forma comprovada, medida através de indicadores de desempenho concretos, que espelhem a efetiva atuação da empresa nestas temáticas. É fundamental que as considerações ESG sejam integradas no tecido das operações diárias do negócio e das estratégias operacionais, quer através da adoção de práticas sustentáveis em toda a cadeia de abastecimento (desde a obtenção de matérias-primas até à produção e distribuição), na avaliação e redução da sua pegada ambiental, como em aspetos sociais, como as práticas laborais, o envolvimento comunitário e os direitos humanos.

E por fim, como costumamos dizer, chegamos ao reporte. E dizemos “por fim” porque o reporte deve ser visto como o fim da linha, o espelho dos esforços implementados diariamente ao longo do período sob o qual se vai reportar, seja externa ou internamente. Ainda observamos diversas empresas que pretendem começar por aqui, e compreendemos, no meio de tanta regulamentação orientada ao reporte, o foco primário está em dar resposta a estas obrigações, sem refletir sobre a necessidade de desenhar estratégias para o futuro, atuar, monitorizar e melhorar continuamente. O nosso papel será sempre apoiar as empresas nas suas necessidades, e isso inclui ajudá-las a percorrer esta jornada da melhor forma possível, permitindo-lhes criar uma relação de confiança com os seus stakeholders através da transparência e responsabilização, para que estes tenham uma visão clara das operações, decisões e impactos da empresa, mas também de incentivo à melhoria contínua, resultando num contexto empresarial mais resiliente e adaptável, garantindo que a estratégia de negócio permanece alinhada com as expetativas.

Artigo de Beatriz Maio, Manager de ESG, a 5 de julho de 2024, para a Revista Sustentável.